Balanço Histórico da Primeira Experiência
Socialista
Por: Ícaro Leal Alves
Este artigo tem por objetivo traçar um breve
balanço da experiência histórica do primeiro socialismo. Pretendemos retirar
lições teóricas e práticas do balanço da experiência do socialismo realmente
existente na União Soviética. Advertimos que diferente das analises correntes
não acreditamos que o socialismo realmente existente, ou o socialismo real seja
algo distinto do socialismo cientifico criado por Marx e Engels e desenvolvido
por Lênin. Pelo contrário partimos de uma perspectiva marxista-leninista de analise
e por isso mesmo acreditamos que não existe dissonância entre teoria e prática
do socialismo.
O comunismo de Marx e Engels não é uma teoria
utopista. O comunismo marxista é o movimento real através do qual o
proletariado liberta-se da dominação do capital. Portanto podemos e devemos
tirar lições práticas e teóricas da experiência do socialismo real para
continuar desenvolvendo o socialismo científico, o marxismo-leninismo, o
materialismo dialético e histórico, a teoria criada por Marx e Engels, mais
tarde desenvolvida por Lênin e aplicada por Stálin na União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas, por nós analisada.
No primeiro capítulo analisaremos a formação
social russa caracterizada pela propriedade latifundiária, o desenvolvimento de
relações sociais de tipo capitalistas e o Estado autocrático, assim como a
ruptura dessas estruturas pela revolução operária. No segundo capítulo veremos
os processos que caracterizam a edificação do socialismo, a industrialização
socialista, a coletivização da agricultura e também as condições econômicas e
sociais concretas nas quais se levou acabo esses processos. Também dedicamos
algumas páginas ao debate entra a teoria do socialismo em um só país e a de
revolução permanente. No terceiro capítulo analisaremos a importância da luta
do Partido Comunista (bolchevique) da URSS contra as oposições. No quarto
capítulo debateremos o desenvolvimento do revisionismo moderno e seu papel na
derrocada do socialismo. Aqui é importante lembra que o espaço limitado de que
dispomos e o caráter geral deste trabalho termina por limitar o nosso alcance
teórico. Por vezes somos forçados a nos ater demais ao aspecto puramente
factual do desenvolvimento dos processos, que na política tem uma importância
por demais inflacionada.
No capitulo quarto esse problema é mais
sensível para nós. Praticamente não abordamos no revisionismo por sua dimensão
teórica, ou o fizemos, pelo menos para o nosso gosto, de uma forma muito
limitada. Por hora é suficiente que o leitor tenha em mente o seguinte ponto; o
revisionismo moderno caracteriza-se pela ideia da coexistência pacífica entre o
socialismo e o capitalismo e com isso nega a necessidade da revolução
socialista nos países capitalistas e da ditadura do proletariado nos países
socialistas. Como consequência os revisionistas modernos negaram também a
necessidade do Partido Comunista como organização de vanguarda do proletariado
que é e tentaram destruí-lo.
Nos Estados Unidos e na Yugoslávia essa
hostilidade do revisionismo ao Partido Comunista ficou mais evidente. Browder
dissolve o partido em uma “associação política”, Tito transforma-o em uma
“liga” com meras funções educativas e não política. Na União Soviética, onde a
tradição revolucionária era mais enraizada pelos 36 anos do regime de Lênin e Stálin,
Kruschov não logrou tanto sucesso em destruir o Partido Comunista. O Partido
continuou a ser na prática o dirigente e esse papel dirigente continuou sendo
consagrado pela constituição do país. Porém, não pode haver dúvidas sobre a
hostilidade do kruschovismo ao Partido Comunista. Sobre esse caráter hostil de
Kruschov os chineses afirmaram de forma brilhante; “Kruschov tem difamado
Stálin ao considera-lo um assassino. Isso não equivale a dizer que durante
várias décadas o movimento comunista internacional teve por líder um
assassino?” Ou seja, os dirigentes chineses perceberam o que estava no fundo
das denuncias dos “crimes stalinistas” por Kruschov, não a acusação de um
homem, mas a acusação de um movimento, a acusação de um partido, o Partido
Comunista.
Aqui chegamos a outro ponto que merece
atenção, os chamados “crimes stalinistas”. Durante décadas Stálin dirigiu um
país gigantesco, arruinado pela guerra e cercado de Estados hostis, sob a
constante ameaça de uma nova intervenção armada. Intervenção que se tornou uma
realidade horrenda por duas vezes e teve por resultado ceifar as vidas de 50
milhões de pessoas. Nesse país a recuperação econômica é sucedida imediatamente
pela industrialização acelerada. Um processo titânico sem precedentes, que
desenvolve enormemente o as forças produtivas, retira da miséria e da
ignorância um povo inteiro e salva o país do esmagamento mais completo pelos
agressores nazifascistas. Por vezes, a
situação crítica do país leva Stálin e os círculos governantes a recorrerem à
violência para salvar o socialismo dos agentes imperialistas. A extensão do
país, as debilidades do aparelho, o frenesi gerado pela guerra total leva a
tremendos excessos. A repressão do período “stalinista” vitimou 800 mil
pessoas, muitas das quais comunistas honrados que lutaram honestamente pelo
socialismo, mas que, porém, caíram nas tramas dos agentes imperialistas, que
tentavam induzir a constantes erros os aparelhos do Estado socialista. Os erros
cometidos não podem diminui a importância dos processos repressivos para salvar
o país da quinta coluna alemã, essa força de guerra colossal que germinara por
todo solo europeu na segunda guerra.
Para chegarmos a um juízo de valor adequado
sobre o papel da repressão staliniana comparemos a extensão e a importância da
quinta coluna alemã, os colaboracionistas, na França e na União Soviética. Se,
diferente da França, o país soviético foi capaz de resistir à ofensiva militar
do Exército nazista e livrar o mundo desse monstro foi porque seus agentes de
espionagem no interior do aparelho militar soviético foram liquidados nos anos
1930 e não puderam ter o poder decisivo que tiveram na França, ou mesmo na
Espanha. Pensemos como nasceu o franquismo durante a guerra da Espanha, em que
forças estrangeiras ele se apoiava, acaso não fora também um agente
quinto-colunista? E veremos a grandeza implícita do “stalinismo”.
Esse é um tema polêmico e assim como o debate
teórico do revisionismo desenvolveremos em um trabalho posterior. É importante
notar que as discussões sobre os processos dos anos trinta tem sua compressão
dificultada por dois fatores; a não compreensão de suas reais motivações e a
enorme falsificação da “historiografia” da guerra fria caracterizada pela
fraude mais desavergonhada. Aqui a apelidaremos como “historiografia de Allan
Dulles” para que se compreenda o seu verdadeiro significado. Por hora
delimitamos o projeto de um futuro trabalho. O desenvolvimento de uma
explicação pormenorizado sobre as falsificações da história do período
staliniano, que visam transforma-lo em algo de similar ao fascismo ou ao
nazismo.
Capítulo
I – A Revolução de Outubro e a Consolidação do Poder
À 25 de outubro (7 de novembro) de 1917[2], as
forças dos guardas vermelhos – operários armados – e das guarnições
revolucionárias de Petrogrado tomam o controle da cidade, então capital do
império russo. Agiam sob o comando do Comitê Militar Revolucionário e do Centro
do Partido bolchevique. À noite, o cruzador Aurora, tomado pelos marinheiros
revolucionários, bombardeiam o Palácio de Inverno, iniciando o assalto sob o
governo, que, sem conseguir forças para defender-se é forçado a se render. Às
10:40 da noite, inaugurava-se o II Congresso dos Sovietes de Toda Rússia. Os
bolcheviques anunciam ao congresso que o Poder havia passado das mãos do
governo provisório burguês às do Congresso dos Sovietes de Deputados Operários
e Soldados.
Nessa
noite, os operários e camponeses da Rússia, que fazia poucos meses haviam
derrubado o poder secular dos czares, rompiam com as correntes da dominação dos
capitalistas e latifundiários, abriam a sua marcha para o socialismo, iniciavam
a crise geral do capitalismo e arrastavam o mundo para uma nova era da história
da humanidade, a era das revoluções socialistas vitoriosas.
Essa
epopeia extraordinária não tem sua importância esgotada. Longe disso, a
compreensão total de sua importância apenas foi iniciada. Esse pequeno artigo
tem por objetivo iniciar um estudo da primeira experiência do socialismo no
mundo através de uma perspectiva marxista-leninista.
a)
A formação social russa no inicio do Século XX
Até o século XIX, o império russo, um enorme
império multinacional, governado pela autocracia czarista dos grã-russos, era o
país mais atrasado da Europa em todos os campos. Na política, o Poder estava
nas mãos de uma monarquia de religião ortodoxa que baseava seu poder, por um
lado, no enorme aparelho militar e policia representado pelo Exército
imperial, pela policial política, a Okhrana, e pelos grupos de cossacos, que
reprimiam brutalmente os operários grevistas, as seitas religiosas não-ortodoxas,
os grupos nacionais minoritários, os intelectuais rebeldes, e mesmo os grupos
científicos, por outro, no tremendo atraso das regiões rurais da Rússia, que
ainda nas primeiras décadas do século XX eram habitadas pela maioria da
população. O isolamento das comunidades rurais, o mir, sua economia de
subsistência, criavam nos seus habitantes, os mujiquins, uma mentalidade
medieval, propicia a dominação dos monarcas russos. No plano econômico, até
1861, reinou a servidão feudal sob os camponeses e não havia sinais de qualquer
desenvolvimento capitalista-industrial considerável (BETTELHEIM, 1979. PP:
189-194 e BROUÉ, 2005. PP: 7-22).
Só
com a derrota do império russo na guerra da Criméia e as revoltas camponesas de
proporções assustados que se seguiram é que a servidão foi abolida, os
camponeses foram declarados politicamente livres, se seguiu uma redivisão das
terras em favor dos proprietários latifundiários e se iniciou o desenvolvimento
de relações de tipo mercantis e capitalistas no campo. A situação dos
camponeses não melhorou, pelo contrário, eles continuaram escravizados de fato
pelas enormes “indenizações” que tinham que pagar a seus antigos senhores pela
sua “liberdade”. Não poucas vezes os camponeses ficavam totalmente privados de
suas terras e tinham de realizar trabalhos extenuantes nas terras dos grandes
latifundiários russos (História do PC (b) da URSS, 1999. PP: 7-8).
Com
o fim da servidão feudal e o desenvolvimento de relações mercantis no campo tem
inicio a transformação de tipo capitalista do país. As cidades se avolumam e se
criam os primeiros centros industriais. Entre a década de 1880-1890 inicia-se
um rápido processo de industrialização. A base desse processo era a indústria
mineira e a construção de estradas de ferro. Até o ano de 1900, 21.000
quilômetros de estradas de ferro foram criados. Nasce uma classe operária
moderna empregada em empresas com grande concentração de capitais que se
elevava a mais de 2 milhões de homens. As condições de existência dos operários
russos nesse período eram as piores. Chegavam a trabalhar 14 a 15 horas por dia
por salários que não passavam de 8 rublos mensais. Logo se inicia o movimento
grevista e se formam as primeiras organizações operárias (História do PC (b) da URSS, 1999. PP.
9-12).
Apesar do rápido desenvolvimento industrial a
Rússia continuava sendo um país agrário, com quinto sextos de sua população
empregada na agricultura. Nesse setor da economia a inserção do capitalismo
dava inicio a uma enorme diferenciação de classes. Processava-se a rápida expropriação
dos camponeses economicamente menos abastados, que dispunha de ínfimos recursos
pecuniários e de quase nenhuns instrumentos de produção e animais de tração, em
proveito dos camponeses mais ricos, os camponeses abastados, ou, kulaks. Por
vezes os camponeses expropriados de suas terras eram arrastados ao trabalho nas
fazendas dos kulaks, em troca de salários, transformando-se assim num
proletariado, ou semi-proletariado da aldeia. Cerca de 80% das grandes
propriedades agrícolas contratavam trabalhadores assalariados já na década de
90 do século XIX (LÊNIN, 1988. PP: 127). Sobre as costas dos camponeses russos
pesava o julgo dos antigos senhores latifundistas, dos novos senhores
capitalistas e do enorme aparato repressor do czarismo. Os operários eram vitimas
do mesmo opróbrio. Eram penalizados pelo atraso da Rússia que nivelava a todos
os trabalhadores num grau de miséria, pelo rápido desenvolvimento do
capitalismo, que lhe cobrava enormes esforços e lhes arrancavam somas incríveis
de mais-valia e pelo aparato policial que reprimia suas manifestações de
revolta.
b)
O Partido Bolchevique
A base dessas enormes contradições surge e se
desenvolve um partido revolucionário, que é o mais revolucionário entre os
partidos revolucionários da primeira metade do século XX, o Partido
bolchevique. Organizado como tendência política no interior do Partido Operário
Socialdemocrata da Rússia, no seu II Congresso (1903) e posteriormente
transformado em Partido independente (1912), os bolcheviques herdam a
experiência do movimento operário e revolucionário das décadas anteriores,
fazem sua a única teoria revolucionária justa, o marxismo, e tem uma
experiência prática revolucionária de 15 anos, que lhes permite conduzir os
operários revolucionários a vitória sobre a burguesia e os grandes
proprietários rurais (LÊNIN, 1980B. PP: 282). O Partido bolchevique tinha por
guias os dois principais líderes e teóricos do proletariado internacional,
Lênin e Stálin. Conhecedores do
pensamento de Marx e Engels e que o souberam aplicar de forma criadora no fogo
revolucionário da luta de classes.
c)
A Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa
Em meio aos enormes sofrimentos da primeira
guerra mundial (1914-1918) os operários russos derrubam o czar Nicolau II, em
fevereiro (março) de 1917, e iniciam uma enorme transformação na Rússia.
A Rússia era então um dos países com a indústria
mais concentrada do mundo e passava por um desenvolvimento modernizador. Porém,
suas estruturas sociais arcaicas, principalmente, a grande propriedade
latifundiária e o poder dos latifundiários eram um obstáculo a esse processo
modernizador. Como consequência o desenvolvimento industrial e capitalista da
Rússia era subordinado, em parte as enormes inversões de capitais do Estado
czarista, mas, principalmente, aos capitais anglo-franceses. Por isso, os
capitalistas russos entram na guerra ao lado da Triplice Entente (França e
Inglaterra e Rússia) para defender os lucros dos capitalistas anglo-franceses e
apoiar os interesses expancionistas do czarismo (BETTELHEIM, 1979. PP: 67-68).
Devido à desproporção de forças militares
entre Rússia e Alemanha e a corrupção das autoridades militares e dos altos
funcionários do governo o país sofre derrota após derrota e se vê em uma
situação difícil. A catástrofe militar na front e a crise econômica na
retaguarda levam a revolta geral dos operários, que já educados pelas batalhas
revolucionárias de 1905-1907 lutam com decisão, atendem ao chamado do Partido
bolchevique, e derrubam o governo em poucos dias, de 24 a 27 de fevereiro (9 a
12 de março) de 1917. Os operários vitoriosos de Petrogrado formam seu Soviet
de deputados operários, que rápido se organizam em outras cidades. Os Sovietes
eram organizações revolucionárias de massa da classe operária, o gérmen do novo
Poder revolucionário (LÊNIN, 1980A. PP: 21-48). Mas, devido à traição dos
dirigentes social-revolucionários e mencheviques, que então conseguem a maioria
dos Sovietes e a falta de maturidade política dos operários para tomar o Poder,
esse cai nas mãos da burguesia (LÊNIN, 1980A. PP: 11-17). Forma-se, em 1º de
março 1917, um governo provisório presidido pelo príncipe Lvov, com a
participação de representantes da burguesia e dos latifundiários, como Miliukov
e Guchkov (História do PC (b) da URSS, 1999. PP: 183 e BETTELHEIM, 1979. PP: 68-69).
O novo governo provisório continua sendo um
governo imperialista e pretende prosseguir a guerra. Porém, as liberdades
democráticas foram estabelecidas pela ação direta das massas. Estabeleceu-se o
direito de reunião, organização, greve e imprensa. O Partido bolchevique foi
legalizado. A maioria dos seus principais militantes, que estavam não prisão ou
no exílio, entre eles Lênin exilado na Europa Ocidental e Stálin preso na
Sibéria Oriental, são anistiados. E podem atuar politicamente de forma aberta e
livre.
Num primeiro momento os bolcheviques não falam
ainda de insurreição. A sua palavra de ordem “Todo Poder aos Sovietes”
pressupõe o desenvolvimento pacifico da revolução. (LÊNIN, 1980A. PP: 16). Na
situação de dualidade de poderes, onde o poder burguês (governo provisório) e o
poder proletário (Sovietes de deputados operários) conviviam pacificamente e o
segundo colaborava e acreditava no primeiro, a atividade dos bolcheviques não
poderia ser outra que explicar pacientemente aos operários que o governo provisório
não lhes daria o que desejavam (LÊNIN, 1980A. PP: 18-19).
Rapidamente a situação se modificaria. As
tentativas do governo de prosseguir a guerra provocam a revolta dos operários.
Nas jornadas de Julho, classe operária de Petrogrado manifesta-se contra o
governo provisório, contra a guerra e pelo poder dos Sovietes. A manifestação
pacifica é respondida com enorme violência por parte do governo. Tem fim a
dualidade de poderes. O governo burguês passa a usar a violência contra os
operários e a concentrar em suas mãos o Poder. A editora do Partido bolchevique
é fechada. O Partido é proibido. Alguns dirigentes bolcheviques são presos.
Decreta-se a prisão preventiva de Lênin e o governo começa a tramar seu
assassinato. O governo tenta desarmar os guardas vermelhos e inicia a campanha
para “restabelecer a ordem”. O ponto máximo dessa campanha é a tentativa de
golpe de Estado do general Kornilov (BROUÉ, 2005. PP: 106-110).
Os bolcheviques direcionam-se para a
insurreição. No VI Congresso (agosto de 1917), após analisar a nova situação, o
Partido aprova a nova tática. Os Sovietes se direcionam para os bolcheviques.
Nas fileiras da burguesia, a confusão. Os partidos da pequena-burguesia se
decompõem rapidamente. Na manha 24 de outubro (6 de novembro) de 1917, o
governo, já sob a direção de Kerenski, lança carros de assalto para tomarem as
oficinas bolcheviques. Às 10 horas da manha, Stálin manda as divisões de
guardas vermelhos e de soldados revolucionários retomarem as oficinas e, as 11
horas, saem os números do jornal bolchevique com o apelo a derrubada do
governo. Na manha do dia seguinte as forças bolcheviques tomam os pontos
centrais da cidade. A noite é tomado o Palácio de Inverno. No Smolni reúne-se o
segundo Congresso dos Soviets, que assume o Poder, votando os decretos da paz
(proposta de armistício e de paz sem anexação para todos os países
beligerantes) e da terra (nacionalização das terras dos latifundiários e sua
entrega ao usufruto gratuito dos camponeses) e elegendo um Comitê Executivo dos
Sovietes de maioria bolchevique e um Conselho de Comissários do Povo presidido
por Lênin e com a participação de Stálin.
A partir de 26 de outubro, os delegados do
Congresso dispersam-se por toda Rússia. Desenvolvem-se lutas pelo Poder
Soviético em toda Parte. Os camponeses agitados pela posse da terra apoiam o
novo Poder dos operários. Até março de 1918, o Poder Soviético está consolidado
em todo país. A terra nacionalizada está sob a posse dos camponeses. São
nacionalizados os bancos. O Conselho de Comissários do Povo dirige o país. A
Assembleia Constituinte burguesa é dissolvida. Dissolvi-se também a policia e o
Exército, em seu lugar é formado o novo Exército Vermelho e a Comissão
Extraordinária de Toda Rússia[3]. O
poder judiciário é submetido ao sufrágio popular. Estabelece-se a igualdade de
direitos para as mulheres e as nacionalidades nãorussas. Instaura-se a jornada
de trabalho de 8 horas. Anula-se a divida externa. O comércio exterior passa a
ser monopólio do Estado Soviético. A indústria pesada é nacionalizada. É
proclamada a constituição da República Socialista Federativa Soviética da
Rússia (História do PC (b) da URSS, 1999. PP: 220-226).
Capítulo
II – A construção do socialismo
Entre outubro de 1917 e os primeiros meses de
1918, a classe operária russa, a frente dos camponeses, e dirigida pelo Partido
bolchevique, destrói o Estado burguês, organiza o novo Poder Soviético dos
operários e camponeses e estrangula a poder econômico da burguesia,
nacionalizando os pontos chaves da economia. Mas, mal começa os primeiros
trabalhos de edificação da nova economia socialista e já é submetida a uma
terrível ofensiva do imperialismo apoiada pela reação interna. As tropas da
Entente, japonesas, alemãs checoslovacas e polonesas apoiadas pelos guardas
brancos russos iniciam a ocupação da Rússia e a guerra contra o Poder
Soviético. Uma guerra pela restauração do capitalismo que custa a vida de 13
milhões de seres humanos. Os operários e camponeses que temem a restauração do
Poder dos latifundiários e capitalistas cerram fileiras em torno do Partido
bolchevique de Lênin e Stálin e rechaçam os invasores. Sob o regime de
“comunismo de guerra” o novo Poder consegue salvar as cidades russas do
desaparecimento pela fome e abastecer o Exército Vermelho[4]. A batalha é dura, e
prossegue até 1920, quando finalmente os imperialistas são forçados a deixar o
País dos Sovietes.
Ao fim da guerra civil e de intervenção
estrangeira seguisse o bloqueio das potencias imperialistas. Os bolcheviques
serão forçados a edificar o socialismo sob as mais duras condições.
a)
A catástrofe do pós-guerra e a Nova Política
Econômica
Após quatro anos de guerra imperialista e três
anos de intervenção militar estrangeira a economia russa está arrasada. O
quadro é de uma verdadeira catástrofe econômica. A produção agrícola equivale à
metade do nível de antes da guerra e a produção industrial é sete vezes menor.
A fundição de ferro em todo ano de 1921 não passou de 3% do nível de 1913.
Escasseiam os artigos de primeira necessidade, como pão, gorduras, carne,
calçado, peças de roupa, fósforos, sal, petróleo, sabão (ELLENSTEIN, 1976A. PP:
170 e seguintes).
Os
camponeses, os mais penalizados pela política do comunismo de guerra, que
impunha penosas quotizações sobre os produtos agrícolas e proibia o comércio
privado de trigo são os primeiros a demonstrar sua insatisfação quanto ao Poder
Soviético. A aliança operário-camponesa rompeu-se na prática (BETELHEIM, 1979.
PP: 211-212).
A
base da ditadura do proletariado também está fragilizada. A queda extrema dos
níveis de produção nos diversos ramos da indústria faz muitas fábricas fecharem
as portas, e os operários desempregados retornam ao campo. A perda da melhor
parte dos efetivos operários para os serviços do Exército Vermelho e da
administração dos Sovietes, enquanto uma massa de pequenos e médios
comerciantes expropriados adere à atividade produtiva muda a composição social
da classe operária (BETTELHEIM, 1979. PP: 158).
A
situação de crise exige uma mudança radical na política econômica do governo
bolchevique. Por isso, Lênin faz aprovar no X Congresso do Partido bolchevique,
de março de 1921, uma serie de medidas econômicas que ficariam conhecidas como
NEP, a Nova Política Econômica. Todas as principais medidas do “comunismo de
guerra” são abolidas, sobretudo a quotização de produtos agrícolas, e é
concedido aos camponeses o direito de comercializar livremente o seu excedente
de produção. São organizadas empresas privadas no ramo do comércio varejista e
da pequena indústria, bem como na indústria artesanal na cidade e no campo.
Reintroduziu-se a moeda e, posteriormente, o imposto em dinheiro. Foi
restaurado o Banco do Estado. Criou-se o plano de eletrificação do país e a
Comissão Estatal de Planejamento Econômico[5].
O
objetivo do Partido bolchevique com a NEP era restabelecer a aliança operário-camponesa,
revitalizar a agricultura através do interesse pessoal do camponês pela
produção, abastecer as cidades de mantimentos agrícolas através do comércio e
com base nisso reestrutura a indústria socialista do Estado para retomar a
ofensiva contra o capitalismo. Era um passo atrás, para poder realizar um salto
à frente (ELLENSTEIN, 1976B. PP: 9-28).
A
política econômica seguida pelo Partido bolchevique não demoraria a dar
resultados. Em 1922, já se havia superado os anos das más colheitas, a indústria
ligeira voltava a se reanimar, contraindo o desemprego, e os salários reais dos
operários crescia. No XI Congresso do Partido, em março de 1922, Lênin afirma,
frente às demandas da oposição de entregar pontos chaves da economia nacional
ao capital imperialista sob a forma de concessões temporárias, que o período de
retirada havia se encerrado e que era a hora de preparar a ofensiva.
Para Lênin, depois de restaurada a economia
nacional tratava-se de realizar a tarefa de construir uma economia socialista
integral na URSS. Acreditava que “o comunismo é o Poder Soviético mais a
eletrificação de toda Rússia” (LÊNIN apud MARTENS, 2003. PP: 53). E reintera
esse pensamento em seu último discurso público, em novembro de 1922, quando
afirma, “Da Rússia da NEP nascerá à Rússia socialista” (LÊNIN, 1980B. PP: 635).
b)
O socialismo em um só país
No dia 12 de janeiro de 1924 morre, em Gorki,
Vladimir Ilitch Lênin. Doravante caberia a Stálin, seu sucessor na direção do
Partido Comunista (bolchevique) da URSS, dirigir os operários e camponeses
soviéticos na enorme batalha pela construção do socialismo.
Nesse
momento o capitalismo mundial passava por um processo de reestabilização
parcial e o movimento revolucionário na Europa ocidental era derrotado. O
Partido bolchevique sabia que o restabelecimento do capitalismo e a derrota do
movimento revolucionário eram somente momentâneos. Porém, não se podia prever quando
nem onde reabrir-se-ia a senda revolucionária. O Partido tinha que resolver a
questão, o que fazer neste interregno? Colocava-se o problema da edificação do
socialismo num imenso país rural isolado e cercado pelo mundo capitalista. A
questão a responder era a seguinte; é possível construir o socialismo em um só
país?
Para
responde a essa pergunta Stálin relembra, em seu discurso na Universidade de
Sverdlov, às palavras do fundador do Partido bolchevique, poucos dias após este
ter falecido;
Todos os grandes meios de produção em poder do
Estado e o Poder estatal nas mãos do proletariado; a aliança deste proletariado
com os muitos milhões de camponeses e muito pequenos camponeses; a garantia de
que o proletariado dirija os camponeses, etc. Acaso não é tudo isso necessário
para que, com a cooperação e apenas com a cooperação, que antes designamos como
mercantilista e que agora, sob a orientação da NEP, merece também de certo modo
a mesma designação, acaso não é tudo isso necessário para construir a sociedade
socialista completa? Não é ainda a construção da sociedade socialista, mas
realmente é tudo necessário e suficiente
– o grifo é nosso – para esta construção (Lênin, 1980B. PP: 657-658).
A base destes ensinamentos, Stálin e o Comitê
Central do Partido bolchevique seguiam acreditando ser possível construir o
socialismo na URSS.
O programa leninista previa a industrialização
socialista – “o comunismo é o Poder Soviético mais a eletrificação de toda
Rússia” – e a coletivização da agricultura através da cooperação camponesa –
“com a cooperação e apenas com a cooperação, construir a sociedade socialista
completa”. A oposição, que agora atuava no interior do Partido bolchevique e do
Estado Soviético prossegue injuriando esse programa e propagando o pessimismo entre
a classe operária quanto ao sucesso do socialismo na URSS. Apoiando-se na
naufragada teoria da revolução permanente, tantas vezes escarnecida por Lênin,
os oposicionistas, trotskistas, zinovievistas e bukharinistas, formulam um
programa alternativo ao programa leninista, que se fundamenta na transformação
da União Soviética em um estado vassalo dos países imperialistas, num
fornecedor de produtos agrícolas para esses, enquanto permanece dependente do
maquinário importado dos países capitalistas mais avançados. Constantemente
tencionam entregar pontos chaves da economia ao capital estrangeiro sob a forma
de concessões ou de empresas de capital misto e até mesmo põem em cheque o
monopólio do comércio exterior. Por vezes dissimulam suas posições capitulacionistas
formulando planos irrealistas de hiperindustrialização.
Trotsky queixa-se em sua obra mais famosa, A
Revolução Traída, de que, em 1929, Stálin adota um plano de industrialização
que previa índices de crescimento econômico idênticos aos exigidos pela
oposição trotskista em 1925, ou seja, quando o país não havia ainda alcançado
os níveis de produção de antes da guerra (TROTSKY. 2005. PP: 63). E ao mesmo
tempo agita a teoria da revolução permanente sob a impossibilidade da
construção de uma economia socialista industrializada num país atrasado como a
URSS.
Para assegurar sua vitória, a vanguarda
proletária deveria, desde os primeiros dias da sua dominação, operar incursões
as mais profundas possíveis não somente na propriedade feudal, mas também na propriedade
burguesa. Fazendo isso ela entraria em coalizões hostis, não apenas com todos
os grupamentos da burguesia que a tinham sustentado no começo da sua luta
revolucionaria, mas também com as grandes massas do campesinato cujo concurso a
teria levado ao poder. As contradições no interior do governo operário de um
país atrasado, onde a maioria esmagadora da população é composta de camponeses,
poderiam encontrar sua solução unicamente sobre o plano internacional, na arena
da revolução mundial do proletariado[6].
Enquanto a oposição trotskista apregoava uma
hiperindustrialização no período em que a Rússia ainda não produzia metade do
que produzia antes da guerra, Trotsky pregava que as contradições do governo
operário daquele país eram insolúveis sem o auxilio da revolução mundial. Não
pode haver dúvidas, o plano trotskista não era outro, senão minar e sabotar a
edificação socialista na URSS.
c)
A industrialização socialista
Seguindo a linha geral leninista do Partido
bolchevique, defendida por Stálin, o Poder Soviético logrou enorme sucesso na
edificação socialista. Os níveis de produção de antes da guerra foram
alcançados e superados no ano econômico de 1926-27. Em 1928-29 entra em vigor
um plano quinquenal que visa uma inversão de 64.600 milhões de rublos na economia
nacional durante os anos de 1928 a 1933. Destes, 19.500 milhões se inverteriam
na indústria[7].
A
tarefa de restabelecer a indústria de antes da guerra foi realizada, mas o
Partido sabia que era impossível construir o socialismo a base da técnica
antiga que caracterizou o período czarista. Esta podia se tornar obsoleta a
qualquer momento. Além do mais, a indústria pesada, a que produzia os meios de
produção era ainda insuficiente e a URSS continuava um país agrário e
dependente do maquinário estrangeiro. Era preciso industrializar o país.
Desenvolver seu setor socialista industrial. Equipar o país de máquinas novas.
Torná-lo independente frente ao capital imperialista estrangeiro.
A
revolução de outubro expropriara os capitais da grande burguesia nacional
russa, pondo todo ele a disposição do Estado socialista soviético. Essa riqueza
já não era mais consumida pelos parasitas capitalistas e podiam servir aos fins
da industrialização. A revolução também anulara a dívida externa contraída pelo
czar, liberando assim centenas de milhões de rublos todos os anos, somente no
que se refere aos juros. A reforma agrária não havia concedido aos camponeses
somente a terra, mas também, cerca 500 milhões de rublos ouro, equivalentes as
rendas da terra, com os quais os camponeses podiam ajudar o Estado no processo
da industrialização. E é com esses recursos imensos que o Poder Soviético
realiza a industrialização socialista na URSS (História do PC (b) da URSS, 1999. PP: 290-291).
Durante
a década de 1930 a URSS realiza com êxito a sua revolução industrial
socialista. Em 1932, a força de trabalho industrial já atingia o número de 6
milhões de pessoas e é erradicado o desemprego em todo território soviético
(MARTENS, 2003. PP: 64). O produto industrial bruto passou de 18.300 milhões em
1927-28 para 95.500 milhões em 1937. A produção de aço foi de 3,3 milhões de
toneladas para 14 milhões no mesmo período. Em 1935, a União Soviética dispunha
de uma potência 4,07 milhões de Kw de eletricidade, 233% do que o previsto para
aquele ano pelo plano de eletrificação de 15 anos elaborado por Lênin em 1920
(MARTENS, 2003. PP: 72-74). Em dois planos quinquenais a URSS havia realizado
seu projeto de industrialização socialista. Passava dum país arruinado que era
em 1921 a uma potência industrial colossal que fora capaz de abater os
agressores nazistas na segunda guerra mundial. A industrialização possibilitou
ainda a realização do socialismo pleno na indústria, pois a indústria
socialista do Estado pode suplantar a indústria privada completamente e ajudou
a realização do socialismo no campo, dispondo máquinas de tração modernas para
a agricultura coletiva (MARTENS, 2003. PP: 63-74).
d)
A coletivização da agricultura
Outra tarefa fundamental para a realização
completa do socialismo na União Soviética era a coletivização da agricultura.
As estruturas agrárias herdadas do período czarista eram arcaicas. A estrutura
de pequena produção mantinha os níveis de produção agrícolas extremamente
baixos e os métodos e ferramentas modernas de produção eram praticamente
inacessíveis aos camponeses. A submissão da agricultura às inconstâncias da
natureza devido ao baixo nível técnico provocava constantes crises de má
colheita e de fome. Uma das mais graves dessas, entre 1891-92, custou à vida de
100 mil pessoas numa área de 500.000 quilômetros quadrados (BROUÉ, 2005. PP:
10).
A reforma agrária do Poder Soviético eliminou
as grandes unidades produtoras dos latifundiários e dessa maneira aumentou o
número de pequenas propriedades agrícolas, diminuindo a quantidade de cereal
fornecida ao mercado. Os níveis de produção agrícolas atingem os de antes da
guerra no ano econômico de 1926-27, mas a quantidade de cereais comercializados
era inferior ao de 1913. Em 1927 a
quantidade de cereais fornecidos a cidade e ao Exército era de 10 milhões de
toneladas contra 18,8 milhões vendidos em média, entre os anos de 1909-1913
(MARTENS, 2003. PP: 76). A essa altura 7% dos camponeses estavam sem terra, ou
seja, 1.700.000 chefes de família, e a cada ano esse número aumentava em um
quarto de milhão. Os camponeses pobres eram 35% e os médios 53% da população
camponesa. Enquanto o número de camponeses ricos não passava de 5% dos
camponeses, mas a sua importância econômica se media não pelo seu percentual
relativamente ao cujo dos camponeses e sim pela quantidade de cereais que
fornecia no comércio. Os kulaks e a camada superior dos camponeses médios, 10 a
11% das famílias realizavam 56% das vendas de cereais. Os setores socialistas
da agricultura, os kolkhoses e os sovkhoses[8] realizavam 1,7% das vendas,
não obstante comercializassem 47,2% de suas colheitas (MARTENS, 2003. PP:
79-80).
Tal era a corelação de forças entre setores
socialistas e capitalistas na agricultura soviética no ano de 1927. A
agricultura coletiva fornecia 570 mil toneladas de trigo ao mercado e os kulaks
2,13 milhões (MARTENS, 2003. PP: 80).
No inicio dos anos vinte o governo planejava
compra os artigos agrícolas a um preço relativamente baixo para dispor de
maiores recursos para a industrialização. Esse projeto é frustrado pelas más
colheitas de 1924-25, quando o kulak aproveita-se da escassez de cereais para
especular com a penúria nos mercados. Nesse ano a União Soviética abandona
também o seu projeto de exportação de cereais e diminui a importação de
equipamentos industriais. A elevação da colheita no ano seguinte permite
reduzir os preços de compra de cereais. Mas, em 1927, a colheita de cereais cai
ao nível de 1925 e os kulaks voltam a rebelar-se contra o preço taxado pelo
Estado. A grave situação nas cidades, onde o comércio de artigos alimentícios
permanecia na mão dos nepman’s[9] e o
desemprego mantém-se elevado até as vésperas da grande virada de 1929 faz notar
ao Poder Soviético que um novo enfrentamento social de classes se preparava
(MARTENS, 2003. PP: 80-81).
A oposição aproveita-se da situação para
lançar sua nova ofensiva. O líder da oposição naquele momento era Bukharin, que
passa a questionar os ritmos de industrialização propostos pelo Comitê Central
e realiza uma defesa aberta do setor capitalista da agricultura, lançando a
palavra de ordem “enriquecei-vos”. Suas opiniões eram respaldadas pelo
economista burguês Kondratiev. Então influente no Comissariado da Agricultura e
das Finanças, Kondratiev pregava uma maior diferenciação de classes no campo.
Estava claro para o Partido que se tratava de uma nova luta revolucionária de
classes entre a via capitalista e a via socialista na agricultura da URSS. Só
existia duas escolhas, ou prosseguir com a diferenciação de classes e o
controle dos kulaks sobre o comércio de cereais ou passar a via da agricultura
coletiva em larga escala (MARTENS, 2003. PP: 81-84).
Em meio a essa situação os Poder Soviético
passa à ofensiva. Entre os anos de 1927-28 aplica contra os kulaks o artigo 107
do código penal soviético que prevê o confisco judicial dos cereais armazenados
para a especulação e fornece parte do trigo confiscado aos camponeses pobres e
médios, que passam a ajudar o Estado na luta contra os especuladores. Adota
também medidas para desenvolver a agricultura coletiva em larga escala. No ano
de 1929 a quantidade de cereais comercializados pelos kolkoses alcança a
quantidades fornecidas pelo kulak dois anos antes, 2,2 milhões de toneladas e
Stálin estabelece para o ano seguinte à meta de 6,6 milhões. O número de
famílias kolkosianas sobe de 286.000, em 1927, para 1.008.000 em 1º de junho de
1929 (MARTENS, 2003. PP: 86).
Os kulaks reagem de forma violenta ao imenso
avanço do movimento kolkosiano. Em muitas regiões assassinam as famílias
kolkosianas e os ativistas do Partido e sabotam a economia kolkosiana. O
Partido passa a política de deskulakização. Passa-se a uma nova etapa do movimento
socialista na agricultura soviética, a uma etapa de verdadeira guerra
revolucionária contra o kulak, trata-se da segunda revolução socialista da
URSS. O Partido, que era extremamente débil das regiões agrícolas a enfrenta
com enormes dificuldades. Em janeiro de 1930, o Partido possuía somente 339.000
comunistas nas regiões rurais, onde a população se eleva a cifra de 120 milhões
de pessoas (MARTENS, 2003. PP: 91)! Pode-se dizer, que pelo menos nos primeiros
anos da coletivização da agricultura, a atuação do Partido não foi muito além
de fornecer orientações e ajudar através do poder econômico do Estado os
camponeses, que realizaram de fato sozinhos, ou, melhor dizendo, de maneira
espontânea, a coletivização. É verdade que o Partido realizou enormes iniciativas
para apoiar ativamente movimento, como a organização dos 25.000[10],
mas, tal movimento continuou no essencial um movimento espontâneo de massas. Em
parte, esse espontaneismo do movimento kolkosiano – resultado da debilidade do
Partido no campo – foi o motivador de inúmeros excessos no movimento
coletivista. Em um artigo de 1930, Vertigens do Sucesso, Stálin os põe a nu e
posteriormente o Comitê Central do Partido toma medidas para limitá-los
(MARTENS, 2003. PP: 110-117). Apesar destes excessos o movimento conquista
enormes sucessos e na segunda metade da década de 1930 a coletivização está
praticamente realizada.
Em 1936, 90,3% das famílias passaram já para a
economia coletivizada (MARTENS, 2003. PP: 118). Cria-se as SMT, estações de
máquinas tratores, e, em 1940, a União Soviética já contava com 522.000
tratores funcionando na agricultura (MARTENS, 2003. PP: 121). Graças a
coletivização a má colheita de 1936 – decorrente das condições climáticas – não
resultaram em uma crise de fome como a de 1891-92, não obstante a população
camponesa haver crescido, de 120 a 132 milhões, entre 1926 e 1934, e a urbana,
de 26,3 para 61 milhões, no mesmo período. O consumo camponês cresceu, no ano
de 1938, relativamente ao antigo regime as seguintes percentagens; 125% para
pão e farinha, 180% para batatas da terra, 147% para frutas e legumes, 148%
para leites e produtos derivados e 179% para carne e derivados. O valor global
da produção agrícola, que oscilava entre 14,7 e 13,1 bilhões de rublos, nos
anos de 1928 a 1934, passou para 23,2 bilhões, no ano de 1940 (MARTENS, 2003.
PP: 123).
Capítulo
III – A luta contra a oposição
A luta contra a oposição pequeno burguesa no
interior do Partido Comunista (bolchevique) da URSS é outro elemento de extrema
importância na luta pela edificação socialista na União Soviética.
A luta do bolchevismo no interior do Partido e
do movimento operário contra tendências antimarxistas é anterior a tomado do
Poder. Já no seu nascimento o bolchevismo desenvolve uma luta encarniçada
contra as tendências pequeno-burguesas no movimento operário. As diversas
tendências opostas ao bolchevismo no movimento operário têm configurações de
esquerda e de direita, mas não são mais que uma complementação dialética das vacilações
pequeno-burguesas refletidas no movimento operário, formando por tanto um único
bloco direitista-esquerdista, que tem como resultado desestabilizar a solidez
orgânica do proletariado, propagar o ecletismo em suas fileiras, tendência
filosófica contraoposta a dialética (LÊNIN, 1980B. PP: 449) negar a necessidade
de uma sólida organização revolucionária do proletariado, que tenha um caráter
único e indivisível. Todas as inúmeras tendências antibolchevistas no movimento
operário estão ligadas por um fio inconfundível de continuidade, a negação da
necessidade do partido revolucionário de vanguarda do proletariado, a negação
da necessidade do Partido Comunista.
O
primeiro inimigo que o bolchevismo enfrentou no movimento operário foi, antes
mesmo de se consolidar como tendência política distinta, o economicismo. Essa
tendência – que era uma tendência pequeno-burguesa de direita – contrapunha a
espontaneidade das massas contra a consciência socialista e exigia que não se
superestimasse o papel do elemento consciente. Não fazia mais que abrir as
portas do movimento operário a influência da burguesia, sob a forma do
sindicalismo que não visa mais que arrancar pequenas concessões à burguesia,
migalhas e esmolas, e não acabar com a exploração capitalista. Contra esses,
Lênin demonstrava que não havia escolha, ou se segue pelo caminho da ideologia
burguesa ou da ideologia socialista, não existe um terceiro caminho, e que
qualquer subestimação do papel da consciência socialista era fortalecer a
ideologia burguesa (LÊNIN, 1979. PP: 107-108).
Os economicistas são derrotados politicamente
por Lênin e o conteúdo de seu pensamento é desmascarado por ele em seu livro “Que Fazer?”, mas sua influência não
desaparece totalmente do movimento operário. Não poderia ser de outra maneira,
enquanto existirem as raízes materiais para seu desenvolvimento, as diversas
teorias que se contrapõe a organização política dos operários independente da
burguesia continuaram a reaparecer sob as mais diversas formas. Os
economicistas são sucedidos pelos mencheviques, que já não negavam mais a
necessidade do Partido, mas tencionam transformá-lo num conjunto amorfo, onde
não era preciso mais do que ser um simpatizante da causa para ser considerado
membro.
Em
1912, o Partido bolchevique passa a se organizar como partido político
independente em relação às demais tendências do movimento proletário. É um
feito histórico Sem precedentes, pela primeira vez um partido operário é
composto exclusivamente por uma tendência revolucionária, baseado em um programa
único e com uma disciplina de ferro, organizada sob os princípios do
centralismo democrático. Tratava-se de um Partido de novo tipo, um partido
leninista (História do PC (b) da URSS, 1999. PP: 142). Porém, as pressões da ideologia burguesa
continuam a se manifestar mesmo nesse partido revolucionário de novo tipo. Uma
série de seus militantes começa a vacilar e reabilitar as velhas teses
pequeno-burguesas que imperam no movimento operário. No VI Congresso do
Partido, em agosto de 1917, Preobrazhenski afirma que a revolução russa só
poderia se encaminha para o socialismo se a revolução proletária triunfasse na
Europa ocidental. Bukharin, manifesta-se na mesma ocasião em favor dessa teoria
pseudomarxista conhecida como “teoria da revolução permanente”, afirmando que
os camponeses formam um único bloco contrarrevolucionário e que, portanto, não
poderiam apoiar a revolução socialista na Rússia.
Nos
anos posteriores a tomada do poder, esses velhos bolcheviques degenerados se
valem dessa mesma teoria que também servira aos mencheviques em seu tempo para
lutarem contra o Partido e sua linha geral leninista. Afirmavam que a passagem
da Rússia ao socialismo resultaria numa catástrofe econômica completa.
A história não os deu razão, a União Soviética
caminhou para via do socialismo integral e longe de conhecer a ruína econômica
completa, conheceu os maiores índices de crescimento econômicos até então
registrados pela história, eliminou o desemprego e as crises estruturais de
fome no campo, bem como elevou um povo de 160 milhões de habitantes do
obscurantismo cultural mais completa ao nível de uma cultura avançada. Porém,
esses homens continuaram a travar sua luta desesperada contra o novo modo de
organização social, cujo triunfo tão maravilhoso não puderam prever e cuja sua
natureza de classe os impulsionava a combater. No que foram apoiados pelo campo
imperialista e a burguesia expropriada que os ajudava.
A
plataforma da oposição ia de encontro às aspirações de um corpo de funcionários
do Estado de alta formação e salários elevados que era hostil a ditadura do
proletariado. No ano de 1922 uma pesquisa realizada entre os funcionários
soviéticos com formação em engenharia demonstra que somente 9% dos antigos
funcionários e 15% dos novos declaravam-se favoráveis ao regime soviético (BETTELHEIM,
1979. PP: 470).
A
demanda dos altos funcionários estatais de livrarem-se do controle dos
comunistas é reforçada pelas diversas alas de oposição no interior do Partido
Comunista, que clamavam pela diminuição do papel do Comitê Central na direção
econômica. Era essa a palavra de ordem da oposição operária, que se opunha pela
esquerda ao papel do partido proletário na direção da economia, exigindo que
essa fosse entregue ao controle dos sindicatos (BETTELHEIM, 1979. PP: 354).
Pela direita, Trotsky e Bukharin não negam abertamente a participação do
Partido Comunista na direção da economia, mas reivindicam a estatização dos
sindicatos e a organização militar do trabalho, o que significa reduzir os
comunistas a meros burocratas estatais e eliminar o conteúdo revolucionário de
sua política (BETTELHEIM, 1979. PP: 350-354, principalmente a página 351). O
fundo dessa política é a eliminação da ditadura do proletariado na direção
econômica e a transformação do Estado Soviético em um Estado burguês, dirigido
por funcionários hostis à ditadura do proletariado.
Notando
a situação de perigo o X Congresso do Partido Comunista aprova, sob a
orientação de Lênin, uma resolução Sobre a Unidade do Partido, na qual se faz
uma profunda analise da tática e do perigo da contrarrevolução burguesa no
período do socialismo. Esse perigo consiste em uma ruptura da unidade do
Partido Comunista, pela qual trabalha a burguesia, valendo-se das vacilações
dos elementos pequeno-burgueses no interior do campo popular e agitando a bandeira
do pluralismo “socialista”, parra corroer a ditadura do proletariado.
No
projeto de resolução apresentado por Lênin sobre a unidade do Partido afirma-se
que na “luta contra o fracionismo é preciso que cada uma das organizações do
partido respeite com o maior rigor a inadmissibilidade de quaisquer atuações
fracionistas.” Exige que o congresso “determine que se dissolvam imediatamente
todos os grupos, sem exceção, que se tenha formado com base numa ou noutra
plataforma.” Ressalta que o descumprimento dessa decisão deve implicar a
imediata expulsão do Partido. Por fim, conclui que para a realização efetiva da
disciplina partidária era necessário conceder poderes extraordinários ao Comitê
Central para expulsar qualquer membro que descumpra as resoluções incluindo um
membro do próprio Comitê Central (LÊNIN, 1980B. PP: 486-488).
Portanto
a luta contra o fracionismo e a oposição dentro do Partido não é de maneira
alguma uma deformação “stalinista”, mas sim um princípio do leninismo,
indispensável para manter a ditadura do proletariado, o qual Stálin soube
defender e desenvolver.
Capítulo
IV – O revisionismo e a restauração do capitalismo
Em meio a uma guerra de classes prolongada o
socialismo estendeu-se sobre um terço do globo terrestre e conquistou enormes
vitórias. Apesar de todas as profecias apocalípticas a edificação da sociedade
socialista completa foi executada pelo Partido bolchevique com enormes
sucessos. As forças produtivas materiais se desenvolveram como nunca antes e o
nível material e cultural do povo trabalhador se elevou de forma impensável.
Somente no primeiro plano quinquenal o número de alunos em escolas superiores
na União Soviética passou de 160.000 para 470.000, e o percentual de alunos de
origem operária aumentou de um quarto para metade (LOSURDO, 2009. PP: 45-46).
A
burguesia imperialista internacional nunca esteve satisfeita com a derrota
sofrida e lançou mão de todos os recursos para derrubar o novo regime. Seu
programa consistia em derrubar o Partido Comunista do Poder e restaurar o
capitalismo. Após a vitória da revolução de outubro de 1917 lançou mão da
primeira tentativa de restauração através da intervenção armada, que tinha no
momento como protagonistas a França e a Inglaterra. Não acomodada pelo fracasso
da primeira expedição, sobrevém uma segunda, cuja violência ameaça extinguir a
vida na URSS, e tem essa como fim declarado (LOSURDO, 2009. PP: 44-45). É a
agressão fascista alemã do inicio dos anos 1940. As duas ações armadas do
imperialismo, anglo-francês e alemão, pela restauração do capitalismo na URSS
custa, ao todo, as vidas de 50 milhões de pessoas naquele país. Trata-se de um
dos maiores crimes da história do capitalismo. Ao mesmo tempo os Estados
burgueses lançam mão da espionagem e da diversão ideológica para sabotar o
projeto de edificação econômica e política do Estado socialista, valendo-se das
divergências no seio do poder soviético recruta os seus agentes e promove
complots, como o organizado pelo general Tukhachevsky (MARTENS, 2003. PP:
217-236).
As
duas ofensivas militares do capitalismo-imperialista internacional, com seus
enormes custos humanos, e os complots militares, não são, porém, capazes de
desviar os povos da União Soviética do caminho da edificação do socialismo. A
burguesia internacional veria ainda a necessidade de lançar mão de outra
cartada. Trata-se do revisionismo.
Já
em abril 1908, Lênin afirmava que o revisionismo consistia em “caminhar a
reboque da ciência acadêmica burguesa” (LÊNIN, 1979. PP: 41). E explicava que
os revisionistas pretendiam “emendar” o marxismo, para assim “melhorá-lo”, mas
tudo que consigam de fato era deformá-lo em sentido burguês (LÊNIN, 1979. PP:
40-46). Para Lênin o revisionismo não
era outra coisa que uma reedição das ideias das correntes socialistas
pré-marxistas (proudhonismo etc.) no interior dos partidos marxistas (LÊNIN,
1979. PP: 41). Ao falar de revisionismo, Lênin tinha em vista sobre tudo as
correntes que se desenvolveram nos partidos socialistas da Europa e da America
com base nas ideias do alemão socialdemocrata Eduard Bernstein e definia a
finalidade última delas, nos seguintes termos, já em 1902; “transformar o
partido marxista, de partido da revolução socialista em um partido democrático
de reformas” (LÊNIN, 1979. PP: 84).
Esse
revisionismo antigo que pregava abertamente a nulidade das esperanças do
marxismo numa revolução social da classe trabalhadora e na vitória do
socialismo é derrotado pelo próprio curso da história, no qual influi
enormemente a atuação do próprio Lênin, de Stálin e de tantos outros marxista-leninistas.
Triunfa a revolução socialista na Rússia, edifica-se uma sociedade socialista
completa neste país, após a tentativa de seu esmagamento pelas tropas do
fascismo alemão o socialismo expande-se pela Europa, combinando a grande guerra
patriótica da URSS e as guerras de libertação nacional dos países da Europa
contra o terceiro reich nazista. Após o esmagamento de Hitler em maio de 1945,
fundam-se os regimes de democracia popular na Europa oriental que a partir de
1948 aderem ao socialismo. A bancarrota do imperialismo japonês aliado dos
nazistas alemães resulta na libertação nacional da República Democrática
Popular da Coréia (do Norte) e da República Democrática do Vietnã, ambas
identificadas com o bloco socialista. A vitória da grande revolução chinesa em
outubro de 1949 direciona para o campo do socialismo o povo mais populoso do
mundo.
A
vitória extraordinária do socialismo a nível mundial fez ver a todos que o
socialismo havia conquistado seu direito de existir. No fim da segunda guerra
mundial é a situação do capitalismo que é capenga e difícil. Perdera para o seu
mercado mundial um terço do globo, os imperialismos japonês, alemão e italiano
deixaram temporariamente de serem potências ameaçadoras, os imperialismos
francês e inglês se encontravam gravemente debilitados. Só uma potência
imperialista saíra fortalecida da guerra, os Estados Unidos da América. Está
precisava reerguer as demais potências e unificá-las sobre sua aza para
lançá-las contra a União Soviética e seu bloco de países socialistas. Mas os
enormes custos de duas guerras mundiais – aqui não se trata dos curtos humanos,
o capitalismo é incapaz de raciocinar dessa maneira, se trata dos custos
estratégicos – haviam convencido aos capitalistas que a estratégia dá
intervenção armada direta não era mais viável – pelo menos não por enquanto –,
que deveriam passar a outra tática. Qual seja?
a)
Histórico do desenvolvimento do revisionismo
O revisionismo moderno, diferente do
revisionismo do período precedente é caracterizado por haver nascido após a
vitória da revolução socialista em um terço do mundo. Portanto, não se tratava
mais de evitar o triunfo dessa revolução e sim de neutralizar as suas
conquistas.
O sistema doutrinário do revisionismo moderno
nasce nos Estados Unidos e é a arma utilizada por esse país para submeter a seu
controle os partidos comunistas dos países socialistas da Europa.
Em 1944, um livro sai à luz, “Teheran, Our
Path in War and Peace”, de autoria do secretário-geral do PC dos Estados
Unidos, Earl Browder. Browder elabora está obra em forma de documento
programático de caráter estratégico e tático para o movimento comunista
mundial. Era na realidade um “porta a fora” de todo o socialismo.
Segundo afirma, suas propostas estavam
respaldadas pela própria política externa do governo soviético. Na verdade,
Browder interpretava e destorcia essa política ao seu bel prazer, fazendo
passar como própria do CC do PCUS, a sua teoria do “espírito de Teerã” (HOXHA,
1983. PP: 21-27).
Segundo
diz, após o fim da segunda guerra mundial, a aliança entre os “Três Grandes”,
URSS, EUA e Reino Unido – estabelecida para derrotar os países do pacto
tripartite – deve prosseguir. A vitória
sobre o fascismo, supostamente faria desaparecer as contradições fundamentais
entre socialismo e capitalismo e a colaboração entre os dois sistemas ajudaria
a superar as tarefas impostas a humanidade nos próximos anos. Valendo-se desse
programa, Browder dissolve o PC dos EUA em uma associação política comunista,
que não tinha como o objetivo a tomada do poder, pois, como afirmava, “o
sistema bipartidário norte-americano está conforme com os interesses da maioria
do povo americano e também com os dos comunistas americanos” (BROWDER apud
HOXHA, 1983. PP: 23).
A
forma radical como Browder destrói os princípios leninistas na organização dos
comunistas americanos, causa enorme revolta entre os outros partidos comunistas
no mundo. Em 1946, Browder já estava liquidado da direção do Partido. Porém sua
orientação política continua a constituir-se numa arma perigosa que será muito
bem utilizada pelo secretário de Estado norte americano, John Foster Dulles.
Especialista
do anticomunismo, John Foster Dulles, sabia que a orientação política do
ex-secretário-geral do PC dos EUA era uma arma eficaz contra a orientação
revolucionária do secretário-geral do PCUS, Josef Stálin. Quando o livro de
Browder aparece em 1944, J. F. Dulles esforça-se em fazer propaganda das “novas
ideias” entre os partidos comunistas dos países europeus. Desde 1941, o governo
americano estabelece os primeiros contatos com esses dirigentes políticos. Para
isso, tinha a mão a Office ofStrategic Services – a OSS – dirigida pelo irmão
do secretario de Estado, Allan Dulles. A OSS infiltra entre os ex-combatentes
comunistas da guerra de Espanha – entre eles haviam comunistas de muitas
nacionalidades – seu agente, Noel Field. Os ex-combatentes da guerra de
Espanha, assim como, comunistas europeu-orientais, exilados na Europa ocidental
subsistiam em situação de completa miséria. Field estabelece amizade com esses
comunistas fornecendo-lhes recursos matérias sob a máscara da assistência
humanitária e ao mesmo tempo utiliza-se desses vínculos para catequizá-los na
doutrina política browderiana. Os processos dos grupos Rajk e Slansky, na
Hungria e na Checoslováquia no inicio dos anos 1950 demonstra até que ponto o
agente dos irmãos Dulles logrou sucesso em sua subversão antissocialista[11].
O Partido onde os serviços secretos logram
maiores sucessos em estabelecer seus agentes é o Partido Comunista da
Yugoslávia. Seu secretário-geral, JosipBroz Tito era, há muito, agente dos
serviços de espionagens estrangeiros. Após a guerra de libertação nacional do
povo iugoslavo contra o nazismo, Tito assume a cabeça do novo Estado iugoslavo.
Esforça-se de todos os modos para transformá-lo em um Estado burguês e em
assegura-se que na República Federativa Popular da Yugoslávia não se
instauraria uma ditadura do proletariado. Tito nega o papel dirigente do proletariado
e do Partido Comunista na nova Yugoslávia e concede o Poder a uma frente
popular, no qual são admitidos mesmo elementos burgueses e monárquicos, como
Subasich. Tito segue na realidade uma política de subordinação ao imperialismo
norte-americano e tenta convencer outros países de democracia popular a não
seguir o caminho do socialismo e sim o do neocolonialismo (HOXHA, 1978. PP:
4-20).
b)
Vitória do revisionismo na União Soviética
Enquanto Stálin estava vivo os planos dos
serviços secretos americanos de destruir o socialismo na URSS e na Europa
oriental através do revisionismo fracassaram. O seus agentes nesses países
foram combatidos e derrotados. Em sua Carta a Tito, Kardjel e o Comitê Central
do Partido Comunista da Yugoslávia, de 4 de maio de 1948, Stálin denúncia os
fundamentos do revisionismo iugoslavo e explica suas origens, demonstrando que
só a situação de completa ilegalidade do Partido Comunista, a absoluta violação
dos princípios do centralismo democrático puderam gerar o triunfo de teses
estranhas ao marxismo-leninismo no interior dum partido comunista[12].
A
denúncia de Stálin do revisionismo iugoslavo pôs em guarda todos os partidos
comunistas e operários dos países da Europa oriental contra os agentes secretos
dos serviços americanos em seus próprios partidos.
Após
a morte de Stálin o revisionismo triunfa na pátria-mãe da revolução socialista.
Mesmo durante vida de Stálin o Partido Comunista da União Soviética começa a
sofrer grandes transformações. Lênin e Stálin sempre alertaram sobre o risco de
degeneração do Partido revolucionário. Afirmam que da sorte desse partido
dependia a sorte da revolução e da ditadura do proletariado. Enquanto eles
estiveram vivos a vigilância contra a degeneração do Partido foi constante e
sempre se produziram movimentos pela defesa do conteúdo proletário deste. O
primeiro desses movimentos foi a primeira grande depuração do Partido realizada
entre 1921-1923, onde foram afastados do partido 170.000 membros, 25% dos
efetivos, por apresentarem posturas incompatíveis como a condição de
comunistas. Os membros eram submetidos ao julgamento de enormes assembleias de
trabalhadores antes de serem expulsos. Stálin deu prosseguimento e desenvolveu
esse método leninista de combate a burocracia.
Após
a grande guerra patriótica o aparelho do Partido passa por tremendas
transformações. Entre o 18º e o 19º Congresso do Partido passaram-se 13 anos.
Começou a se consolidar nos extratos superiores da direção elementos
revisionistas, que não se opunham diretamente as diretrizes marxista-leninistas
de Stálin, mas as deformavam burocraticamente. Falando sobre a difícil situação
criada no interior do Partido pelo aparato revisionista já nos últimos anos de
Stálin, o primeiro-secretário do Partido do Trabalho da Albânia, nos dá tal
quadro;
Los aparatos no sólo no informaban correctamente a Stalin y deformaban
burocráticamente sus justas directrices, sino que habían creado una tal
situación en el partido y en el pueblo, que cuando el mismo Stalin, en la
medida en que le permitían su edad y su salud, se reunía con las masas del
partido y del pueblo, éstas no le informaban de las deficiencias y los errores
que sucedían, ya que los aparatos habían inculcado a los comunistas y a las
masas la idea de que <<no debemos inquietar a Stalin>> (HOXHA,
1980. PP: 49).
Após a sua morte segue-se um acerto de contas
à moda dos gangsteres americanos entre os clãs revisionistas que se apoderaram
do Partido. Kruschov leva a melhor, assassinando Béria e seus seguidores
(MARTENS, 2003. PP: 337).
A
vitória de Kruschov e sua ascensão a função de secretário-geral do PCUS resulta
na liquidação da ditadura do proletariado e de todos os princípios
marxista-leninistas na política e na organização do Partido Comunista. O PCUS é
transformado em um partido de burocratas e o Estado Soviético em um Estado
burguês ordinário. Os dirigentes do Partido que tentam se opor a tal situação
são afastados do Poder acusados de serem um grupo antipartido e “stalinistas”.
É o caso de Molotov e Kaganovich. O pior, Kruschov depõe o “grupo antipartido”
contrapondo o dispositivo militar contra a maioria do Bureau Político do
Partido (MARTENS, 2003. PP: 338-340). Todos os princípios leninistas haviam
sido liquidados.
A
vitória da linha revisionista é coroada no XX Congresso do Partido,
fevereiro-março de 1956, com a leitura por Kruschov de seu relatório secreto.
Neste, Stálin, até então herói inconteste do movimento comunista, foi
denunciado como o mais “horrendo monstro humano, entre todos os monstros
humanos”. O relatório secreto não tinha outro fundamento histórico que as
inúmeras falsificações produzidas primeiro nos gabinetes da Gestapo e depois
nos de Allan Dulles. Daí em diante o “stalinismo” transforma-se em um
espantalho contra uma política verdadeiramente marxista-leninista. E o
antisstalinismo o “cavalo de Tróia” com o qual Kruschov seduz os partidos
comunistas dos demais países para seu campo de colaboração com o imperialismo.
Todos
os condenados nos anos 1930 como inimigos do povo são reabilitados como
“vítimas do stalinismo”. Nos países de democracia popular a situação é mais
grave. A Yugoslávia de Tito é reirmanada a comunidade de países socialistas e
seus agentes voltam a contar nas fileiras dos partidos comunistas e operários
dos demais países europeus orientais. Na Polônia o antigo agente titistaGomulka
chega a exercer a função de secretário-geral Partido Operário Unificado da
Polônia.
A
linha política do PCUS é toda modificada para se adaptar as aspirações dos
novos dirigentes revisionistas de transformar a União Soviética em uma
superpotência imperialista. a orientação da luta contra o imperialismo e o
capitalismo é substituída pela da coexistência pacífica com o imperialismo e a
URSS assume uma postura imperialista em relação aos demais países do bloco. Os
dirigentes kruchovistas pretendem, assim como os revisionistas iugoslavos e
antes deles os fascistas italianos e os nazistas alemães, que a República
Popular da Albânia não se industrialize, que permanecesse um país agrícola
dependente. Esse país assim como a RP da China terminaria por ser expulso do
bloco socialista por não atender as demandas social-imperialistas dos
revisionistas soviéticos.
A
orientação política kruchovista sobrevive à deposição de Kruschov e termina por
corroer completamente a unidade do bloco de países socialistas e degenerar o
Partido Comunista da União Soviética em um partido burguês, que a partir do seu
XXVII Congresso, em março de 1986, orienta-se abertamente para a restauração do
capitalismo.
Conclusão
Em outubro de 1917 rompe-se a cadeia mundial
do imperialismo pelo seu elo mais fraco. Os operários e camponeses da Rússia
tomam o Poder dirigidos pelo seu Partido bolchevique. Entre, outubro de 1917 a
março de 1953, a classe operária dirigida pelo Partido Comunista guia o povo trabalhador
da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas em uma luta de classes
generalizadas pela construção do socialismo. Primeiro Lênin e depois Stálin
comandam um povo de cerca de 160 milhões de seres numa luta sem precedentes na
história pela edificação de uma sociedade socialista completa, uma nova
sociedade sem a exploração do homem pelo homem. Após a morte de Lênin, em
janeiro de 1924, Stálin lidera o Partido Comunista (bolchevique) da URSS na
construção do socialismo, defendendo o marxismo-leninismo contra as deformações
das tendências oportunistas de esquerda e de direita.
A
vitória do socialismo resulta os maiores sucessos. A URSS alcança os maiores
índices de crescimento econômico até então realizados, elimina o desemprego, as
crises crônicas de fome e conquista um aumento extraordinário do nível material
e cultural do povo soviético.
Sob
a direção de Stálin o Exército Vermelho, o Partido Comunista e o povo soviético
derrotam os agressores nazistas e destroem a maior máquina assassina da história.
Após a guerra o socialismo expande-se a um terço do território do globo.
A
reação burguesa consegue triunfar após a morte de Stálin. O revisionismo de
Earl Browder e de Tito chega à cabeça do primeiro Estado socialista do mundo no
XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética.
O
revisionismo destrói todos os fundamentos do socialismo na URSS, levando-o a
sua derrocada. Os revisionistas começaram por questionar a necessidade do
partido revolucionário. A negação do Partido proletário e da ditadura do
proletariado era sua pedra de toque. Quando finalmente essa estava liquidada
percebeu-se que o que restou foi, a ditadura da burguesia. O balanço da
primeira experiência histórica do socialismo deve nos ensinar, que não existe
um terceiro caminho, ou a ditadura da burguesia ou a ditadura do proletariado.
BIBLIOGRAFIA
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português, inglês por: Henrique Canary, Rodrigo Ricupero e Paula Maffei.
Tradução da introdução por: Maria Cecília Toledo – São Paulo: Editora Instituto
José Luís e Rosa Sundermann, 2005.
SITES CONSULTADOS
A
Rússia do período czarista utiliza um calendário distinto do calendário
ocidental. O calendário utilizado pela Rússia czarista tem uma defasagem de 13
dias com relação ao calendário ocidental. Após a revolução socialista o poder
soviético adota o modelo ocidental. As datas anteriores a revolução apareceram
com o indicativo do calendário ocidental entre parênteses.
Vide
BETTELHEIM, 1979. PP: 146-178 e 201-209 sobre o “comunismo de guerra”.
Vide
BETTELHEIM, 1983. PP: 47-79 para as medidas que caracterizam a implantação da
NEP.
Vide
ELLENSTEIN, 1976B. PP: 118-136 sobre o primeiro plano quinquenal.
Os
25.000 eram operários recrutados pelo Poder Soviético para serem enviados as
regiões agrícolas da URSS durante o período da coletivização. Os 25.000
ajudavam os camponeses a organizar a direção das fazendas coletivizadas e os
instruíam na condução dos tratores agrícolas. Vide sobre os 25.000 MARTENS,
2003. PP: 93-96.