sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

A Campanha Midiática Contra a Coreia do Norte Prossegue



A Campanha Midiática Contra a Coreia do Norte Prossegue

Por Ícaro Leal Alves

Kim Jung-un atual secretário geral do Partido do Trabalho da Coreia


A campanha da imprensa contra a Coreia do Norte (República Popular Democrática da Coreia) continua. Vejam essa reportagem de O Estadão:

“Novas fotos do ditador norte-coreano Kim Jong-un durante uma reunião de trabalho chamaram atenção por uma ‘raridade’ no país: um smartphone. O telefone usado por Kim seria um modelo fabricado em Taiwan. No começo do ano, o líder deu ordens para que os norte-coreanos que forem flagrados com telefones contrabandeados de outros países sejam fuzilados.” (ESTADÃO, 07/02/2013 - http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,kim-jong-un-aparece-com-um-smartphone-,993984,0.htm)

Acontece que em outra reportagem mais antiga de outro órgão jornalístico podemos encontra a seguinte informação; “A Coreia do Norte conta com mais de 1,5 milhões de utilizadores de telemóveis, número que traduz um crescimento superior a 50 % face aos 950 mil registados no final do ano passado, informou hoje o diário sul-coreano Chosun Ilbo.” (EXPRESSO, 21/11/2012 - http://expresso.sapo.pt/utilizadores-de-telemoveis-na-coreia-do-norte-aumentam-mais-de-50--num-ano=f768482)

O mais interessante. Ficamos sabendo na mesma reportagem que “Em virtude de um acordo com o governo da Coreia do Norte, a Orascom [grupo egípcio de telecomunicações] presta serviços de telecomunicações móveis com serviços 3G desde 2008 através da empresa conjunta Koryolink.” (EXPRESSO, 21/11/2012 - http://expresso.sapo.pt/utilizadores-de-telemoveis-na-coreia-do-norte-aumentam-mais-de-50--num-ano=f768482)

Ou seja, na Coreia do Norte não só não é proibido o uso de telefones moveis estrangeiros como o grupo responsável pela distribuição de telefones naquele país é também estrangeiro.

O site de Noticias terra, que também noticiou o fato – e também apresentou uma serie de especulações contra o governo norte-coreano –, não fez qualquer menção a ameaças de fuzilamentos, como também informou que a empresa taiwanesa que produz os smartphones não quis identificar o aparelho, sendo a “confirmação” da marca do produto especulação do governo de Seul. (Tecnologia.Terra, 5/02/2013 - http://tecnologia.terra.com.br/kim-jong-un-e-o-misterioso-smartphone,b797b1fb8cd9c310VgnCLD2000000ec6eb0aRCRD.html)

Um órgão de imprensa português, que recentemente noticiou falácias sobre o canibalismo generalizado devido à fome na Coreia do Norte, O Diário de Notícias, conseguiu ser mais objetivo que o Estadão, noticiando simplesmente; “A imprensa sul-coreana especula sobre qual seria a marca do aparelho, pois alguns dos possíveis fabricantes são empresas de países sem relações com Pyongyang. Para alguns meios de comunicação trata-se de um Samsung, outros dizem ser um HTC (de Taiwan) e para outros seria um iPhone da norte-americana Apple.” (Diário de Notícias, 05/02/2013 - http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3035352&seccao=%C1sia)

Na mesma reportagem de O DN, encontramos uma informação que arranca algumas gargalhadas. A saber, “Os serviços secretos da Coreia do Sul também concluíram que seria mais provável ser da marca taiwanesa”. É possível um maior atestado da falta de argumentos dos governantes do sul do que a necessidade de seus serviços secretos investigarem a marca do aparelho telefônico do líder do governo do norte?

Logo em seguida o mesmo site reiterou a informação já mencionada. “A HTC, por sua vez, recusou-se a confirmar que seria um dos seus aparelhos”.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Sobre a Bulgária Socialista



Trecho do livro do jornalista australiano Wilfred Burchett, de 1983, sobre a Bulgária socialista:



"Por que deveria eu escrever um livro sobre a Bulgária? Enquanto escrevia, eu me perguntava por que não o tinha feito antes. Entre os quase quarenta países da Europa, das Américas, da Ásia, da Oceania e da África nos quais trabalhei, incluindo uma dúzia nos quais fixei residência semi-permanente, a Bulgária é o país que visitei mais frequentemente e mais regularmente. O motivo da Bulgária não ter inspirado um dos meus numerosos livros é que estive ocupado sobretudo em escrever reportagens nos pontos mais conturbados do mundo. A Bulgária era o porto seguro onde eu me retirava entre uma e outra tempestade. Descansar sobre as areias do Mar Negro e lançar linhas para apanhar alguns de seus peixes tem um extraordinário efeito terapêutico! No mundo agitado no qual era obrigado a trabalhar para os editores e diretores de jornais, a tranquilidade da Bulgária se revestia de uma qualidade rara que, por fim, merecia uma investigação e reflexão próprias. 

            "Com o passar dos anos tornou-se evidente – praticamente embaixo de meus próprios olhos – que uma nova geração de gente, com ideais novos, estava forjando o futuro do país. Criancinhas cujas cabeças eu costumava afagar e cujos pais eram, em sua maioria, de origem muito humildes, tinham se tornado chefes de departamento governamentais, diplomatas, médicos, cientistas nucleares, especialistas em cibernética. As aldeias e depois as cidades se transformaram e se tornaram irreconhecíveis. O antigo axioma marxista sobre os trabalhadores que “nada tinham a perder, a não ser seus grilhões” tinha perdido seu sentido. É verdade que isso vale também para a maioria do mundo desenvolvido. Entretanto, quando pela primeira vez visitei a Bulgária, o país era dos menos desenvolvidos entre os países reconhecidamente subdesenvolvidos da península balcânica. Os “grilhões” foram substituídos gradativamente pelos privilégios de uma vida decente, civilizada e refinada. Havia muitas razões para investigar mais a fundo que nas areias e nas águas do Mar Negro. 

           " A Bulgária, que em sua parte do mundo, permanecera durante longos séculos no “olho do ciclone”, devastada por um sem-número de guerras e um outro tanto de invasões, agora goza a paz e a estabilidade. Ela tomou muitas iniciativas para neutralizar o que costumava ser chamado o “barril de pólvora da Europa”. Se agora o povo não tem mais “grilhões a perder”, poderiam ter perdido tudo que suas mãos e seus intelectos tinham construído depois de terem enxotado seus grosseiros invasores em 1878, e especialmente depois da derrubada do governo monárquico-fascista sessenta e seis anos depois, caso houvesse uma nova guerra. Na Bulgária, “Paz e Amizade” não é apenas mais um slogan sem sentido. É uma condição de sobrevivência, baseado no legado de uma história trágica que várias vezes viu a nação à beira da extinção. E foi o povo que aguentou as consequências de aventuras militares que governantes búlgaros e alienígenas travaram entre si, no interesse de grandes potências imperialistas. O fato que pessoas comuns, do povo, estejam agora dirigindo seus próprios assuntos em todos os níveis, em vez de uma classe alta cristalizada e eternamente no poder, parece ser um fator de estabilidade percebida por qualquer visitante, e ao mesmo tempo o legítimo espírito do internacionalismo. Hoje a Bulgária tem um público muito instruído e bem informado. Quando da minha primeira visita em 1948, haviam 20.000 matriculados nos institutos de ensino superior. Hoje este número está quintuplicado e existe dez vezes mais pessoal cientifico e técnico – construindo um estado próspero e progressista. Praticamente todos são de origens humildes, como já mencionei, e com um interesse forte e legítimo de manter a calma e a estabilidade que todos os anos atraem para a Bulgária alguns milhões de turistas. 

            "É licito perguntar por que o autor, normalmente associados a problemas asiáticos e a lutas de libertação nacional, chegou a visitar com tamanha frequência a Bulgária. Em questões de consciência política alcancei a minha “maioridade” na Austrália, quando o fascismo e o nazismo estavam ascendendo na Europa. Parecia então que varreriam qualquer coisa que estivesse em sua frente. Foi então que surgiu aquele que um dos meus amigos políticos definiu “um homem que é uma montanha”, um búlgaro chamado Georgi Dimitrov. Com todo o poderio da máquina política nazista formada contra ele, este homem denunciou a verdadeira natureza dos nazistas, conquistando uma extraordinária vitória legal, moral e política. Os resumidos relatos de sua magnifica defesa no processo do incêndio do Reichstag que chegaram até a Austrália, seu triunfal duelo de oratória com o valentão nazista Hermann Göering, foram raios de pura luz num mundo que estava se obscurecendo. Mais tarde, a iniciativa de Dimitrov em prol de uma frente unida contra o fascismo e a guerra ecoou em todo coração e intelecto progressista. Para dezenas de milhões de jovens da minha geração no mundo inteiro – como percebi mais tarde através de minhas leituras e viagens – Georgi Dimitrov era o modelo do militante internacional e destemido. Comecei a me interessar pelo país e pelo povo que tinha produzido este “homem que era uma montanha”. Nem sonhava que muitos anos depois iria efetivamente apertar suas mãos na capital da Bulgária. A primeira impressão, como sempre acontece com os que são realmente grandes, foi sua personalidade simples e humilde. 

            "Quando conheci o povo búlgaro, descobri que Dimitrov reunia em si suas qualidades especiais de coragem, laboriosidade, perspectiva internacional – e também humildade e simplicidade. 

            "Um ano depois daquele memorável encontro eu estava mais uma vez em Sofia – para o enterro de Dimitrov. Na rua o povo chorava abertamente numa demonstração tão unânime de dor como nunca vi em qualquer outro lugar. 

            "Além do meu interesse inicial na Bulgária de Dimitrov, fiquei profundamente impressionado ao ver como um país economicamente atrasado e seu povo oprimido tinham se esforçado para se pôr de pé e estavam se lançando à ambiciosa tarefa de construir uma sociedade socialista desenvolvida. 

            "Enquanto absorvia o que estava acontecendo em termos humanos, tive o privilégio de me casar com uma jornalista e historiadora de arte búlgara que habitualmente me acompanhava durante os 34 anos de frequentes viagens em sua pátria. Os capítulos seguintes representam uma síntese das observações durante este período, rematado por uma série intensiva de visitas no verão de 1981 e também na primavera de 1982, incluindo muitas entrevistas com líderes de setores vitais do desenvolvimento econômico e social do país. 

            "Em menos de quatro décadas a Bulgária, que já foi um dos estados economicamente mais atrasados da Europa, foi transformado em estado industrializado moderno – com certeza o mais próspero dos Balcãs. Antigamente o produto nacional era gerado em 80% pela agricultura e em 20% pela indústria: está proporção está agora invertida, e 80% do produto nacional agora é gerado pela indústria. Uma revolução industrial foi levada a cabo sem os choques e as fraturas sociais da revolução industrial clássica que sacudiu a Inglaterra durante quase oitenta anos, na segunda metade do século dezoito e na primeira metade do século dezenove. Obviamente uma das diferenças mais importantes está no fato que a Bulgária tinha um sistema sócio-político que podia dirigir o processo de forma científica, absorver os choques e proteger os interesses dos que eram diretamente atingidos pela transformação. Como resultado, a Bulgária está rapidamente alcançando países ocidentais desenvolvidos, superando de muito suas taxas de crescimento econômico sem inflação, equiparando-se a estes em muitos campos de tecnologia sofisticada e desafiando-os com o padrão de vida do cidadão comum. 

            "Um fator vantajoso para a Bulgária e alguns outros países socialistas é que sua revolução industrial de ontem e sua revolução científica-tecnológica de hoje se efetuaram e estão ainda se desenvolvendo dentro da estrutura de um sistema socialista internacional garantindo pelo poderio econômico da União Soviética. Considerando que, há quatro décadas, um país como a Bulgária começou praticamente do zero em termos de indústria, sua base industrial é moderna e altamente sofisticada quando comparada a muitos setores de países que lideraram a revolução industrial dois séculos atrás. E considerando que a Bulgária está integrada num sistema internacional cujos componentes estão cooperando – e não competindo – entre si, pode se alcançar uma especialização de diferentes setores da economia entre os estados-membros, proporcionando uma produção em grandíssima escala de determinados artigos. Isso permite uma renovação constante de equipamentos, acompanhado os mais recentes avanços tecnológicos em tal medida que poucas empresas particulares, destas que competem entre si na área nacional ou internacional, poderiam igualar. 

            "Com emprego total, um programa econômico e de produção planejado antecipadamente para um quinquênio, mercados garantidos e padrão de vida em elevação constante, a Bulgária conseguiu evitar a distorção social que aflige os países industrializados ocidentais enquanto mergulham sempre mais profundamente no caos econômico e na crise. (Nos dez países da Comunidade Econômica Européia a estimativa oficial de desemprego era, no fim de março de 1982, de 10.7 milhões, ou aproximadamente 9,7% de um total de 110 milhões de trabalhadores. Calculava-se que esta taxa subiria para 11,5% em fins de 1982. Com a taxa prevista de crescimento econômico de 1,5 por cento – em vez de uma estimativa anterior de 2 por cento – não há esperança de melhora. Entre os sub-empregados o desemprego já alcança aproximadamente 20%.) Pelos padrões ocidentais na Bulgária praticamente não há prostituição, consumo de drogas e criminalidade. Contrastando profundamente com os países da CEE e dos Estados Unidos, os orçamentos para a assistência social, a assistência à infância, a educação, a saúde pública, a cultura, os esportes e as colônias de férias aumentam constantemente. Em termos de acesso aos bens de consumo, o padrão de vida dos trabalhadores com emprego total do ocidente ainda é mais elevado do que o dos correspondentes na Bulgária, entretanto a diferença está diminuindo. E também está diminuindo a diferença de padrão de vida entre os trabalhadores das áreas urbanas e das áreas rurais, inclusive no que se refere a atividades sociais, o lazer, a diversão. 

            "A interpenetração entre cidade e campo está produzindo uma sociedade homogênea, com uma cultura que liga rico patrimônio nacional com o estrangeiro, para criar novos valores. A cultura é um produto de classe, acessível a todos e não apenas limitado a uma classe privilegiada. A Bulgária é uma sociedade aberta e fraternal; o povo está bem informado e ansioso para se comunicar e cooperar com os povos do mundo além de suas fronteiras, de forma ativa e criativa, especialmente no que se refere à paz e ao desenvolvimento de relações amistosas e humanas.
            
        "À luz de todos os critérios normais para o que constitui “a qualidade de vida”, o povo búlgaro está conseguindo mais e mais elementos essenciais; os povos do Ocidente industrialmente desenvolvido conseguem sempre menos. A tendência está firmada; não há sinais de uma possível mudança. A Bulgária socialista foi edificada sobre fundações muito sadias e – exceto no caso de uma catástrofe internacional – continuará a construir uma sociedade socialista adiantada."

(BURCHETT, Wilfred. Bulgária; presente, passado e futuro. - Rio de Janeiro: Novos Rumos, 1983. pp. 7-14)